Gargalos e os 5 Passos Para o Foco
Assim como o fluxo de um líquido é obstruído pelo pescoço estreito de uma garrafa, os gargalos de processo – ou restrições – são a parte de um processo onde a natureza do fluxo muda significativamente.
A capacidade de um processo geralmente é determinada por seus gargalos. O tempo de ciclo de um gargalo tem impacto direto no takt time do processo inteiro. Os gargalos, embora não sejam algo ruins em si, podem ser percebidos como o elo mais fraco da cadeia do processo. As restrições do processo podem ser reduzidas com planos de ações focados, por exemplo, os 5 passos para o foco, resultando em taxas de produção melhores.
Por que os gargalos ocorrem?
Os gargalos surgem simplesmente porque em qualquer processo – seja uma linha de produção ou um processo de negócio – diferentes atividades demandam diferentes períodos de tempo ou diferentes fases possuem diferentes capacidades, devido ao número desigual de recursos.
Fluxos e recursos desiguais em estágios diferentes, às vezes, podem estar conectados à superprodução. Ao invés de produzirem o que foi pedido, as equipem produzem o que podem com o prazo e a capacidade material que possuem. Ao invés de tirarem vantagem do gargalo, a situação acaba piorando. Assim os depósitos ficam abarrotados de produtos acabados, cuja demanda pode ter alterado nesse meio tempo.
As restrições também podem ser resultado de mal planejamento ou coordenação insatisfatória (veja efeito chicote).
Um gargalo também pode representar um risco econômico elevado, porque ele geralmente ocorre à plena capacidade, potencialmente aumentando o desgaste de maquinário, e sem redundância. Por exemplo, se uma fábrica de plásticos deve produzir uma peça grande, para a qual há somente uma injetora de plástico disponível, essa mesma máquina se tornará o gargalo, gerando um risco potencial de significativa ociosidade para a linha de produção inteira, caso a máquina venha a quebrar.
O motivo das restrições serem tão predominantes na cadeia de suprimentos é devido a um fenômeno bom ter dado errado. Nos anos 1970, o planejamento computorizado se tornou bem-sucedido – os gerentes adoravam tais sistemas (MRP ou ERP) por causa de sua alta precisão, mas, às vezes, os sistemas não eram atualizados e as equipes confiavam completamente nas máquinas, ao invés de verem o que estava acontecendo no chão de fábrica, que acabava ficando abarrotado de materiais.
Finalmente, gargalos também ocorrem devido ao processamento em lote. Às vezes, máquinas e trabalhadores somente estão disponíveis por tempo limitado durante o dia ou a semana. Para aumentar a eficiência, portanto, a matéria-prima é organizada em lote, de modo que as janelas de tempo sejam totalmente utilizadas. O problema com isso é que se tolera uma quantidade excessiva de matéria-prima ou produtos semiacabados da etapa anterior, que por sua vez consolida o gargalo e representa muda (desperdício).
Exemplo
Etapa | Duração |
---|---|
1 | 2 h |
2 | 2 h |
3 | 5 h |
4 | 1 h |
5 | 2 h |
No sistema tradicional de lote-e-fila, as etapas 1 e 2 rapidamente formarão um excesso de estoque ocorrendo na etapa 3, transformando-a em um gargalo, com as etapas 4 e 5 aguardando ociosamente pela conclusão da etapa 3.
Os gargalos não só causam desperdícios por meio da superprodução, como também levam as etapas seguintes a períodos contínuos de ociosidade.
Como resolver gargalos com os 5 passos para o foco?
No Lean, analisamos o fluxo de valor para reduzir desperdícios, portanto, gargalos que levem a desperdícios adicionais devem ser considerados ruins, certo? Não necessariamente. Gargalos são como a vigilância de vizinhos sobre a sua linha de produção, muitas vezes apontando para problemas no processo, porém raramente são a causa principal. Os gargalos provocam aumento no tempo de ciclo – o tempo que você leva para honrar os pedidos dos clientes, mas se você sabe como lidar com as restrições, pode melhorar todo o seu processo.
Um dos pensadores, de quem o movimento Lean pegou emprestado, foi Eliyahu Goldratt. Ele apresentou uma metodologia conhecida como os 5 passos para o foco, que trabalha especificamente na melhoria da taxa de produção, reduzindo os tempos de ciclo e elevando a satisfação do cliente. Os 5 passos introduzem mudanças positivas por meio de… gargalos!
Passo 1: Identificar o gargalo
A Teoria das Restrições de Goldratt estipulou que se você melhorasse a taxa de produção em qualquer lugar que não o ponto do gargalo, causaria ainda mais perdas. Isso pode ser visto na tabela acima – se melhorarmos a taxa de produção das etapas 1 e 2, ainda mais itens ficarão empilhados na frente da etapa 3. Se a taxa de produção da etapa 5 fosse melhorada, também seria um desperdício, porque sua nova velocidade incrementada nunca seria provada, pois a etapa 3 não seria capaz de supri-la na velocidade necessária para atingir sua plena capacidade.
Líderes participantes de uma caminhada Gemba devem identificar as pessoas ou máquinas que estejam sempre ocupadas, enquanto outras permanecem ociosas. É muito comum que uma pessoa ou máquina, com uma grande pilha de trabalho à sua frente, seja o gargalo.
Você sabia?
A Kanban Tool® visualiza as etapas de um processo como colunas, facilitando a identificação de gargalos. Experimente essa abordagem simples, porém brilhante e aproveite os demais benefícios do quadro de processo virtual, incluindo limites de WIP, automação de processos, controle de horas e relatórios.
Passo 2: Explorar/honrar o gargalo
Para explorar um gargalo, primeiro precisamos identificar se o gargalo é uma parte válida do processo – certifique-se de que a restrição não seja uma etapa desnecessária, p. ex., um equívoco de gerenciamento.
Se o gargalo for uma parte do processo necessária e geradora de valor, então certifique-se de que ele esteja fazendo somente o trabalho requerido. Por exemplo, em uma equipe de desenvolvimento de software, você pode ter razões para achar que um dos desenvolvedores é o gargalo, mas quando vai até ele, descobre que ele precisa lidar com documentos de requisitos realmente incompletos. Logo, além de programar, ele mesmo precisa gastar um tempo, que ele não tem, caçando os requisitos corretos. Ao garantir que ele tenha todas as informações necessárias, seu tempo de desenvolvimento pode ser reduzido significativamente.
Passo 3: Subordinar o restante do processo ao gargalo
Significa que o gargalo define a velocidade de entrega, como um timoneiro em um barco a remo. Logo, as etapas 1 e 2 devem entregar a uma velocidade que gere um suprimento de trabalho com o qual o gargalo seja capaz de lidar. A Teoria das Restrições chama isso de abordagem drum-buffer-rope (tambor-amortecedor-corda), em que uma corda metafórica está amarrada a uma restrição, fazendo com que o restante da linha de suprimentos a acompanhe. A corda assegura que a linha não supra o gargalo nem rápido demais, nem devagar demais, causando sua ociosidade. A corda assume o papel de um amortecedor, garantindo que a equipe saiba quando está ficando sem folga.
Uma indústria Lean considera os amortecedores de processo um estoque “bom”, já que servem para equilibrar as flutuações na demanda entre as etapas individuais. O tamanho do amortecedor deve corresponder exatamente à situação e ser tão grande quanto necessário e, ao mesmo tempo, tão pequeno quanto possível. O estoque “ruim” é desperdício de qualquer forma, resultante de superprodução, estoque de materiais desnecessários ou excedentes de produção.
Passo 4: Elevar o gargalo
Neste ponto, você vê como o restante de processo de produção pode ajudar com o gargalo. Por exemplo, talvez as etapas 4 e 5 de nossa tabela possam ajudar na etapa 3, caso esteja sobrecarregada. No Kanban, este processo é conhecido como swarming (como um enxame) – a equipe tenta aliviar o gargalo redistribuindo recursos (nesse caso, força de trabalho) e, assim, aumentar a produção. Alternativamente, você pode expandir o gargalo, aumentando sua capacidade: talvez você precise de máquinas em maior número ou mais rápidas ou mesmo uma melhor automação dessa etapa.
Exemplo Voltando à tabela do exemplo de processo acima, se você pudesse dobrar a capacidade da etapa 3, digamos, colocando uma segunda máquina para funcionar em paralelo, poderia reduzir o tempo de processamento da etapa 3 de 5 para 2,5 horas.
Passo 5: Recomeçar o processo, reexaminar o gargalo
O último passo da teoria é garantir que você recomece o processo com a nova velocidade e observe como as coisas estão fluindo através do gargalo. Se necessário, recomece do início. Você não precisa mais focar na restrição, assim que concluir que não importa a melhoria que faça, o gargalo não melhora mais o seu tempo de ciclo. Quando isso acontecer, significa que o gargalo significativo passou para outra área de sua linha.
Prepare seu processo para lidar com gargalos
Gargalos sempre ocorrerão e você precisa ficar de olho neles. Organizar suas equipes ou linhas de processo em células em forma de U podem rapidamente permitir que os membros de equipe supervisionem a linha inteira. Desse modo, as equipes podem constatar imediatamente a ocorrência de gargalos e ajudar. Ter Andons como parte da linha pode permitir que os membros de equipe parem a linha quando necessário ou, ao menos, informem sobre o fluxo corrente.
Para equipes que não compartilham um escritório, mas colaboram usando um quadro Kanban virtual, uma solução eficaz para visualizar e resolver os gargalos é adicionar raias de enfileiramento ao processo. Cada etapa do quadro deve ser dividida em trabalho aguardando, em andamento e concluído, ou, ao menos, “fazendo/feito”. Desse modo, se aparecer um gargalo, ficará claro, em questão de segundos, onde e por qual motivo ele surgiu – uma etapa está processando itens muito devagar ou muito rápido, uma etapa está sendo sobrecarregada com itens vindos de um estágio anterior, etc.
Maneiras adicionais de ajudar a resolver gargalos
Técnicas para resolução de problemas também são úteis ao lidar com gargalos. Eliyahu Goldratt desenvolveu uma técnica chamada Evaporating Cloud (Nuvem Evaporativa): geralmente, os gargalos ocorrem porque processos industriais lidam com premissas que simplesmente não são precisas. A Nuvem Evaporativa olha para as interdependências no processo, o que precisa de mudança e para quais fins. A ocorrência de gargalos costuma ocultar a causa raiz de efeitos indesejados na produção. Por isso trabalhar com métodos Lean é benéfico – as técnicas ajudam a fazer as perguntas certas para chegar à causa raiz dos gargalos do processo.
Usar os 5S, manter as linhas do processo limpas e conduzir Gemba ajudam a identificar gargalos facilmente. Finalmente, inspecionar o Diagrama de Fluxo Cumulativo permite que você confira o impacto das iniciativas de melhoria sobre os seus gargalos e o tempo de ciclo de seu processo.
Principais benefícios de resolver e trabalhar com gargalos de processo:
- Produtividade aumentada e tempos de ciclos menores, com menos paradas e instabilidades de produção
- Meio padronizado de lidar com congestionamentos e mudanças de processo
- Superprodução contida – menos desperdício de tempo e esforço das equipes
- Uma taxa de produção mais previsível e estável – levando a equipes e clientes satisfeitos
Leitura adicional
- Lean Thinking: Banish Waste and Create Wealth in Your Corporation (LIVRO)
- Swarming: A Team-based approach to getting work done
- Theory of Constraints (LIVRO)
- Flow in the Office: Implementing and Sustaining Lean Improvements (LIVRO)
- The Lean Turnaround: How Business Leaders Use Lean Principles to Create Value and Transform Their Company (LIVRO)